R 4 — Stalker (1979) - A Zona como Interstício

Direção: Andrei Tarkovsky



O filme Stalker, de Andrei Tarkovsky, propõe uma jornada a um espaço enigmático e instável chamado Zona, onde as regras da realidade se desconstroem e a verdade nunca é entregue de forma direta. Dentro deste território, a promessa de um lugar que concede desejos é constantemente frustrada pela hesitação dos personagens, que nunca chegam ao centro do mistério. O espaço da Zona não é apenas geográfico, mas também psicológico, remetendo a um estado de suspensão entre o desejo e a impossibilidade.

Esta mesma noção de intervalo, de um espaço onde tudo está por acontecer mas nunca se concretiza plenamente, encontra eco no conceito central do meu projeto Interstício. Tal como os personagens de Stalker vagueiam sem certezas, enfrentando suas inseguranças e medos, o artista sem obra habita um espaço de dúvida e espera, onde a criação parece estar sempre à beira de se manifestar, mas permanece em suspensão.

O ritmo do filme, marcado por planos longos e composições visualmente densas, amplifica a sensação de hesitação e inquietude. Tarkovsky trabalha com o tempo de maneira dilatada, permitindo que a atmosfera do filme crie um peso quase físico. Em Interstício, esse peso se materializa no polvo congelado, deslocado em espaços banais, tornando-se uma metáfora visual para o bloqueio criativo e para a angústia da inércia artística.

Outro ponto de contato entre Stalker e o meu projeto é a tensão entre realidade e expectativa. No filme, nunca há uma resposta clara sobre se a Zona realmente concede desejos ou se tudo não passa de uma construção ilusória alimentada pela fé dos personagens. Em Interstício, o deslocamento do polvo para cenários cotidianos cria uma estranheza semelhante, onde a banalidade e o absurdo se sobrepõem, gerando um espaço de interpretação aberto.

Por fim, Tarkovsky usa texturas visuais — água, ferrugem, paisagens degradadas — para criar um ambiente sensorial onde o tempo parece corroído. No meu trabalho, a materialidade do polvo e sua relação com os espaços onde é colocado também operam nessa lógica, onde o que é familiar se torna inquietante e onde a própria criação artística é colocada em crise.

Se Stalker é um filme sobre a travessia de um território incerto, Interstício é uma investigação sobre habitar esse território. Ambos lidam com a impossibilidade de respostas definitivas, com o desconforto da espera e com a fragilidade do desejo de criação.



Voltar